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Conheça, também, o primeiro Aleateorias.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

FUTEBOLÍSTICAS VIII: UM HOMEM CHAMADO FENÔMENO


© Markus Ulmer/dpa/Corbis

Ele certamente cometeu erros na vida, decepcionou pessoas, não soube avaliar corretamente algumas situações. Ele é humano. Mas é um ser humano fenomenal. Foi sua formidável habilidade como jogador de futebol que lhe rendeu o apelido de Fenômeno. Pra mim, fenomenal é sua capacidade de transformar adversidade em combustível para a força de vontade.
Sua última falha foi não ter percebido que já tinha chegado o tempo de pendurar as chuteiras e se dedicar a novos desafios fora das quatro linhas. Seu último acerto, por enquanto, foi ter acreditado que era possível vencer mais uma batalha contra a desconfiança e as críticas. Ainda que tenha perdido.
Quando procurei uma imagem para ilustrar este post, pensei nas várias fotos que foram feitas hoje, de seus olhos lacrimejantes no momento em que anunciava a aposentadoria como jogador. Mas não é assim que vou me lembrar dele. Nem o mundo. Para mim e para o mundo, a imagem que vai ficar é a do vencedor, nem tanto nos campos quanto na vida.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

ALEATEORIAS XXXVIII


Minha rotina foi atingida por dois falecimentos nesse fim-de-semana. Sábado à noite, Anna me ligou avisando que o cozinheiro de um restaurante que costumávamos freqüentar morreu na virada do ano e, desde então, o restaurante está fechado. Ontem de manhã, foi a vez de meu pai me ligar para avisar que meu avô morreu, depois de passar a semana quase inteira internado. Sem medo de parecer desnaturado, devo admitir que fiquei mais triste pelo cozinheiro do que pelo meu avô.
A verdade é que meus vínculos emocionais com meu avô foram rompidos há uns 15 anos, desde que tivemos que recebê-lo em casa após um AVC, do qual ele nunca se recuperou totalmente. Nunca consegui aceitar o modo como ele tratou meus pais, como se fossem escravos que deveriam se curvar diante de cada uma de suas exigências absurdas e não membros da família que estavam tentando fazer o seu melhor, inclusive sacrificando as economias da família, para que ele tivesse um pouco mais de conforto. Nesse ponto, meus pais são mais controlados. Quem realmente brigou com meu avô fui eu. Alguém tinha que dizer o que todos estavam pensando e sentindo. Desde então, só o encontrei uma vez ou outra e nunca passei de um cumprimento educado.
Mudando de assunto, amanhã a correria começa de verdade. Na semana passada, já voltei às aulas na FTML e foram definidas as minhas turmas no colégio. Amanhã, reunião de planejamento (esse é o nome oficial, porque de planejamento mesmo ela não tem praticamente nada e é até um momento bastante inútil, a bem da verdade). Ainda estou pensando no programa de História deste ano. Começamos a rascunhar alguma coisa no ano passado, mas ainda preciso fazer os últimos ajustes antes de apresentar aos colegas o programa para este ano e os dois próximos. Também não consegui adiantar a preparação das aulas das primeiras semanas como eu queria. Vou ter que correr um pouco mais com isso agora.
A cabeça está voltando a assumir o comando aos poucos. O coração ainda sente saudades e tristeza, mas a proximidade da correria que o trabalho exige parece já ter algum efeito aqui. As sessões de massagem e acupuntura também têm ajudado. No final das contas, sei que vou sobreviver, mas ainda sinto falta do alívio emocional que a presença da Anna trazia à minha vida. Enquanto estou ocupado ou em companhia dos amigos, até que tenho me virado bem, mas ainda não lido muito bem com os momentos em que estou só.
Anna me acompanhou no funeral do meu avô em solidariedade à minha mãe (elas gostam muito uma da outra e tenho a impressão de que minha mãe vai continuar tratando a Anna como a nora). Antes disso, jantamos juntos na sexta e no sábado (a do sábado não estava no programa). Reencontrá-la foi menos difícil do que eu imaginava, mas a vontade de segurar a mão dela, de dar um abraço e um beijo foi muito grande. Acho que vamos mesmo conseguir manter a amizade, embora eu queira muito mais do que isso. Também foi um bom momento para conversar algumas coisas que ainda precisavam ser ditas. Tenho a impressão de que voltamos a nos comunicar de uma maneira que não vínhamos fazendo nos últimos dois anos. Pena que seja tarde demais.


Mais da coluna “Aleateorias” no antigo Aleateorias.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

QUANDO AS PALAVRAS NÃO RESOLVEM V


Essa é e não é a música que traduz o momento. Há alguns anos, prometi que sempre estaria ao seu lado. Mesmo que não seja do jeito que eu sonhava, serei fiel não só porque prometi, mas porque é você. Queria poder enxugar suas lágrimas.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

FUTEBOLÍSTICAS VII: A NOITE EM QUE FALTOU CORINTHIANS AO CORINTHIANS

© Jim Cummins/Corbis

Sempre que escrevo sobre o Corinthians aqui no blog é para tripudiar. Se não é sempre, é quase. Não sei dizer se essa vontade de rir das desgraças alvi-negras está ligada à minha adolescência sãopaulina ou se é porque tenho amigos corintianos muito apaixonados, que realmente sofrem pelo time. Provavelmente as duas coisas. Imagino que essa possibilidade de me divertir à custa do sofrimento alheio seja a principal razão de eu acompanhar tantos jogos do Corinthians, seja pelo rádio ou pela televisão. (Se bem que, em se tratando de futebol, eu paro para acompanhar qualquer jogo de quem quer que seja). Hoje (na verdade, entre ontem e hoje, graças à Globo, que tem que passar novela antes e manter os apaixonados por futebol acordados até o início da madrugada), como não podia deixar de ser, parei para assistir a inusitada derrota do milionário Corinthians para o quase desconhecido Deportes Tolima. E, uma vez que já me diverti o bastante via Twitter e celular, quero aproveitar para apresentar o que penso sobre vitórias e derrotas no futebol.
No futebol, como todos sabem, a probabilidade de vitória de um time mais fraco sobre um time mais forte é muito maior do que em qualquer outro esporte. Aliás, provavelmente é o único esporte em que é possível um time jogar bem e perder para outro que deu sorte em um único lance. Vencer, perder, empatar, erros da arbitragem, desonestidades de vários tamanhos, tudo isso é parte do futebol. Quem vive nesse mundo sabe e, por mais que discorde, grite, esperneie, acaba aceitando isso, afinal, a bênção e a maldição do futebol são uma só: bom ou mau, o resultado do jogo já está feito e logo temos que nos preparar para o próximo. Há pouco tempo para comemorar ou lamentar.
É claro que todos preferem comemorar sucessos, especialmente num país como o nosso em que o segundo colocado é apenas o primeiro na lista dos perdedores, mas existem derrotas que aprendemos a aceitar. São aquelas derrotas em que, apesar da frustração, reconhecemos em nossos jogadores o espírito de luta, a vontade de vencer, a força para tentar até o último momento. Cada time tem em sua tradição algum aspecto de onde se retira esse espírito: o passado glorioso, a origem étnica ou social, os símbolos sacramentados de uma fé muitas vezes superior à religião, a própria torcida…
Não é de hoje que estranho esse time do Corinthians. Desde o ano passado, me parece que o Corinthians não é mais o Corinthians. Não digo isso por conta dos maus resultados, até porque eles não têm sido tão ruins assim, nem da falta de títulos, porque eles têm acontecido. Digo isso porque me parece que o Corinthians é, hoje, um time muito distante de sua verdadeira identidade.
O Corinthians não é só uma agremiação esportiva que tem uma equipe profissional de futebol. Ele é o Timão da Fiel, um time que, claro, tem um grande número de torcedores espalhados em todas as camadas sociais — é um time massa —, mas é fundamentalmente um time popular, de gente simples e humilde. Sua origem é tão humilde que sua fundação se deu numa esquina! (Não posso deixar de rir diante do fato de que o Corinthians continua sem-teto — aliás, o comunicado à imprensa diz que o Fielzão começará a ser construído no dia 1.º de abril, o que já é outra piada pronta). O corintiano padrão é, como ele mesmo diz, “maloqueiro e sofredor, graças a Deus”. E é dessa origem simples, da massa trabalhadora que ergueu São Paulo, que o Corinthians herdou sua identidade: garra acima da técnica, coragem acima da lógica, vontade acima da capacidade, fé acima de tudo. Mesmo eu, que nunca fui corintiano, aprendi a respeitar essa tradição. E me parece que essa tradição foi esquecida.
O Corinthians deixou de ser um time de futebol e se tornou uma marca, um produto, um projeto de marketing, que é vendido a preços exorbitantes a um pequeno grupo de endinheirados que, é claro, são apaixonados pelo time, mas que não traduzem o verdadeiro espírito da Fiel. E sem a verdadeira Fiel nas arquibancadas, o Corinthians se torna um time comum, porque, muito mais do que qualquer outra torcida de qualquer outra equipe, a Fiel carrega o Corinthians. Ela quer ver nos jogadores a mesma paixão que ela tem pelo time. Ela perdoa os defeitos daqueles que entram em campo e ali entregam tudo o que têm. Ela não aceita a passividade, a falta de vontade, a ausência de espírito de luta com que Tite e seus comandados caminharam pelo gramado do Manuel Murillo Toro. Embora o lado gozador tenha saído satisfeito com o resultado, minha paixão por futebol me faz lamentar muito, não pela derrota, mas pelo modo como ela veio.
Assisti, nos últimos anos, esse apequenamento acontecer com a seleção brasileira. Agora vejo acontecer com um dos gigantes paulistas. Sempre acreditei que o futebol venceria no final. Ainda acredito, mas começo a perceber que já não tenho tanta convicção.


Veja mais da coluna “Futebolísticas” no antigo Aleateorias

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

QUANDO AS PALAVRAS NÃO RESOLVEM IV


Chorei de madrugada mais uma vez, um choro muito mais duro e muito mais longo do que todos os outros. Mas foi diferente. Em vez ouvir minha razão me recriminando por chorar daquele jeito, ouvi uma voz que há muito tempo eu não ouvia: “agora é o tempo de chorar”. Hoje, pela primeira vez em dias, acordei me sentindo leve. A caminho do trabalho, com o mp3 no ouvido, foi essa música que Deus usou para falar comigo. É claro que ainda sinto saudades, que ainda sinto tristeza, mas não sinto mais a dor. Deus me deu todo o tempo que eu precisava para chorar. Agora ele começou a tratar as feridas. Obrigado por tudo!

OSSOS DO OFÍCIO VII: DE VOLTA OUTRA VEZ


© Images.com/Corbis

A chegada do fim das férias é sempre marcada por uma certa ansiedade. Existe sempre aquela preocupação com a distribuição das classes; fico preocupado com a possibilidade de ter que me deslocar de uma escola para outra para completar minha carga semanal de aulas; tenho a esperança de não ter que acordar tão cedo ao longo do ano; fico em dúvida entre trabalhar à noite, período em que me sinto bem, com alunos geralmente muito fracos ou de manhã, o pior período do dia para mim, com turmas mais fortes; como vão ficar as negociações com os outros professores da área para que todos saiam satisfeitos com a distribuição de aulas; quem serão os professores das outras áreas que vão trabalhar com as mesmas turmas… O número de inquietações é enorme.
Este é um ano que já começa um tanto diferente dos demais. Nos últimos anos, as férias não têm sido suficientes para que me recupere do cansaço físico e mental, principalmente o mental. (Já falei disso antes e, por isso, não vou me alongar nesse ponto). Outra mudança importante é o fato de que vou voltar a trabalhar com PDH, uma disciplina de apoio curricular que, na prática, acaba se tornando um curso de Atualidades. Essa é uma boa mudança, já que considero as aulas de PDH muito mais divertidas do que as de História. O que eu realmente gostaria de fazer é pegar todas as turmas de PDH e só completar a grade com algumas aulas de História, mas eu estava tão cansado (some o sono de quem teve que acordar às 6h da manhã ao esgotamento físico e mental que estou sentindo e você terá uma idéia de como eu estava na escola) que nem percebi quando o diretor me perguntou se eu continuaria trabalhando com todos os 3.ºs anos da manhã. Só quase agora percebi o que aconteceu e já é tarde demais. Agora é agüentar, mas já é melhor do que o ano passado, quando não tive nenhuma turma de PDH. Finalmente, a mudança tecnicamente mais significativa é que vou ter carga completa de manhã e só uma turma à tarde. Depois de 3 anos trabalhando em 3 turnos, finalmente vou poder manter uma rotina mais racional. Só não é o ideal porque vou continuar acordando às 5h da manhã todos os dias. (Eu realmente ODEIO acordar cedo).
O ano passado foi muito ruim em termos de trabalho. A bem da verdade, ele foi muito ruim no geral e já no meio do ano eu dizia que 2010 era um ano que eu gostaria de apagar da minha vida. Infelizmente, não tenho como fazer isso e nem como evitar as conseqüências do desastre que ele foi. (Estou tentando enfiar janeiro de 2011 no mesmo saco em que coloquei quase todo o ano de 2010 e me livrar de tudo isso de uma vez só). O diretor já me avisou (e eu já esperava por isso) que está na lista de prioridades dele conversar comigo sobre o que deu errado no ano passado — já está ficando repetitivo, mas preciso mesmo dizer que 2010 foi ruim. Eu até já sei quais são as críticas e cobranças que a Direção e a Coordenação têm a fazer e a maioria delas é muito justa, mesmo que um bom número dos problemas fosse fruto de situações que não estavam exatamente sob meu controle.
Vão me cobrar mais responsabilidade com os prazos burocráticos (justo, atrasei a entrega das notas em todos os bimestres e a devolução de provas e trabalhos — e isso quando consegui devolver provas e trabalhos, porque alguns ainda estão aqui do meu lado —, mesmo que grande parte da burocracia seja absolutamente inútil); mudanças no processo de avaliação (mais ou menos justo, porque minhas provas e trabalhos têm objetivo de preparar os alunos para o modelo  e pressão de vestibular, mas as notas são realmente muito ruins no geral); mais cuidado com as ausências, mesmo que elas sejam provocadas por problemas de saúde (justíssimo, nem tenho idéia de quantas aulas perdi no ano passado por conta da depressão e do cansaço); mudanças no programa do curso para que ele tenha mais conteúdo “histórico” e menos “filosofia” (inaceitável, já que eles estão adotando as definições mais rasas e simplórias do que sejam História e Filosofia); mudanças no estilo de aula (mais ou menos justo, porque a maioria dos alunos não consegue acompanhar aula expositiva e muitos abusam da liberdade que dou para que resolvam se querem ou não prestar atenção, mas o argumento de que “colegial não é faculdade” é absurdo, especialmente quando querem que eu troque isso por aulas do tipo “Ctrl+C, Ctrl+V”).
Aproveitei para conversar um pouco com o Adilson, professor de Filosofia que tem sido meu principal parceiro de discussões e trabalho. Na verdade, a considerar o conteúdo intelectual desse cara, eu é que sou o sidekick. É interessante como nunca concordamos, mas estamos sempre juntos e trabalhamos bem. Concordamos hoje que nutrimos um pelo outro grande estima no aspecto relacional e profundo ódio intelectual. Nos últimos anos, estamos tentando aproximar as várias disciplinas das Ciências Humanas e montar uma linha-mestra comum (termo que consideramos semanticamente muito curioso, aliás — uma das poucas coisas em que concordamos), já que temos menos aulas e muitos conceitos complexos que exigem um diálogo maior com outras áreas. Boa parte dos professores nos detesta por conta dos questionamentos que provocamos nos alunos, especialmente com relação à epistemologia de suas áreas, mas já assumimos que não estamos lá para fazer amigos e que é mais importante (e divertido) ajudar a criar uma situação em que alunos e, principalmente, professores sejam obrigados a refletir.
Agora tenho mais ou menos uma semana para remontar dois cursos — 2.º e 3.º ano, principalmente o 3.º — e pensar pelo menos no 1.º semestre de PDH. Nesse caso, também preciso pensar em como vou convencer os outros professores a trabalharem pela linha que eu quero. E ainda preciso montar o material para as primeiras aulas. Quero deixar pelo menos duas semanas de aulas já montadas. Essa vai ser a parte complicada, porque não pretendo aproveitar quase nada do que fiz no ano passado. (Mais uma vez, 2010 é um ano que quero esquecer).
Quase não falei com os outros professores. Com a maioria deles, tenho, no máximo, uma relação profissional educada. Tenho certeza de que quase todos eles gostam muito mais de mim do que eu deles. Além disso, o sono e as inquietações da mente não me deixaram à vontade para aquela tradicional conversa fiada de volta das férias. E tenho a impressão de que eu também não estava com uma cara muito amigável, já que quase ninguém veio falar comigo, o que não me desagradou nem um pouco.
O ano promete. Espero que seja menos cansativo e que as coisas façam mais sentido — porque pouca coisa é tão sem nexo quanto a educação pública. Mas não acho que isso vai mudar algum dia.


Mais da coluna “Ossos do Ofício” no antigo Aleateorias.

Conheça, também, o primeiro Aleateorias.