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quinta-feira, 5 de julho de 2012

FUTEBOLÍSTICAS XII: CORINTIANO POR UMA NOITE

© Abril/Ivan Pacheco

O título do post não é exatamente verdade. Foram duas noites: a de ontem e a da quarta-feira da semana passada, as duas noites das finais da Libertadores.
Não tenho o hábito de torcer por um time só porque ele é brasileiro. Seria muito incoerente, já que raramente torço pela seleção brasileira. Sempre fui admirador assumido do futebol argentino. Gosto da obediência tática e do modo como eles fazem a guerra de nervos. E sempre me diverti muito tripudiando em cima dos insucessos corintianos. Perdi uma das minhas piadas futebolísticas favoritas ontem. E no final do ano que vem perderei outra. Então, o mais natural seria eu torcer pelo Boca nessas últimas semanas.
Não sei dizer o que me levou a quebrar minha tendência histórica ontem. É claro que não gritei, não vibrei, não sofri (se bem que praticamente corintiano nenhum sofreu ontem — novos tempos?). Apenas fui dormir com uma leve sensação de satisfação. Nada comparável ao que imagino que meus amigos corintianos estão sentindo. E tenho a impressão de que a satisfação se deve muito mais ao fato de eu ter assistido um dos grandes capítulos da história do futebol brasileiro ser encerrado, não pelo título corintiano em si.
Muita gente me pergunta como alguém tão racional e contido pode gostar tanto de futebol. A melhor resposta que encontrei até o momento é que o futebol é uma das poucas coisas que me permite experimentar essa euforia como uma pessoa comum. É uma das poucas coisas que não tento reduzir a um conjunto de racionalizações. Simplesmente curto o momento. Não com a mesma intensidade de um torcedor de verdade, claro. E até sinto inveja de torcedores apaixonados, mesmo que seja por um time insignificante futebolisticamente.
Hoje tem mais futebol. E vou estar lá, na frente da TV, torcendo (do meu jeito) por um time que não é meu. Mas hoje serei mais coerente. Hoje, sou Coxa.

terça-feira, 3 de julho de 2012

SAPERE AVDE X: MORAL, ÉTICA E ALIANÇAS POLÍTICAS


O mundo muda o tempo todo e, portanto, é natural que as pessoas também mudem de vez em quando. Aliás, seria muito estranho se não fosse assim. Pense bem: uma pessoa que nunca muda, vivendo num mundo que está sempre mudando, só pode ser louca ou estúpida. Ou teremos que considerar a possibilidade de realmente termos encontrado alguém perfeito, o que é altamente improvável.
É importante que as pessoas mudem. E não é só porque nossa civilização não existiria de outra maneira. É porque nosso desenvolvimento espiritual exige que passemos por mudanças. E não digo isso num sentido estritamente religioso. Uma pessoa que nunca muda nunca está aberta à possibilidade e necessidade de reconhecer erros e, mais importante, aprender com eles. Aceitar a possibilidade de mudanças — para nós mesmos, para os outros e para o mundo inteiro — é, portanto, um passo importante para que possamos nos tornar pessoas melhores.
Espera-se, é claro, que todos tenhamos um conjunto de valores inegociáveis. Esses valores são essenciais para que sejamos reconhecíveis, apesar das mudanças. (Abre-se uma exceção a essa regra para os casos em que os valores em si são errados — pensando bem, não é exatamente exceção). Em outras palavras, o limite das mudanças deve ser dado pela moral e pela ética.
Moral é a distinção entre o que é bom e o que é mau. Todos somos capazes de entender isso, uma vez que, essencialmente, nosso julgamento moral se baseia na sensação de prazer ou desprazer associada a um comportamento ou estímulo. Quando nascemos, nosso senso moral se baseia exclusivamente em sensações físicas. Com o tempo, incorporamos ao nosso julgamento moral outros parâmetros, a maioria de ordem emocional.
O problema da moral é sua extrema relatividade. Uma vez que nosso juízo entre bom e mau está ligado ao prazer e considerando que o conjunto dos estímulos prazerosos varia de um indivíduo para outro, é bastante razoável afirmar que o número de conjuntos morais é igual ao número de pessoas. Somos cerca de 7 bilhões de pessoas, cada uma com seu próprio senso moral. Boa parte delas tem um bom número de valores comuns, mas é absolutamente impossível falar em moral universal.
Para resolver o problema do inevitável conflito de interesses e sistemas morais, existe a ética. Embora não desconsidere bom e mau como parâmetros, a ética prioriza o que é certo ou errado. Numa escala maior, continua valendo o que é bom ou mau, mas a ética nos permite compreender que aquilo que é certo não necessariamente é bom para mim individualmente, mas deve ser para a sociedade como um todo. Mas a sobreposição das necessidades e vontades coletivas sobre o indivíduo tem um limite claro: a dignidade humana. Em hipótese alguma, a ética pode aceitar que a dignidade de uma pessoa seja prejudicada, mesmo que em benefício da maioria.
Mudanças são inevitáveis e imprescindíveis. E isso vale em todos os campos da atividade humana, especialmente a política. (Entenda-se política como a articulação das capacidades individuais de reflexão e ação para a construção, interpretação e transformação da realidade humana, ou seja, não simplesmente o processo da política institucional, mas todo processo das relações humanas). Sem mudanças de opinião, discurso, alianças, a prática política torna-se estagnada, engessada, inútil. É pelo confronto de idéias e pelo convencimento (ou seja, mudança) que a sociedade se mobiliza (mais mudança) para construir (outra mudança) algo melhor do que o que temos agora.
Mas, então, por que essa foto provoca tanta repulsa a tanta gente? Várias respostas possíveis.
A primeira e mais simples delas é que mudanças são sempre traumáticas. Por mais importantes que sejam, mudanças podem ser muito desagradáveis, especialmente porque somos incapazes de dizer, com certeza, qual vai ser o produto dessa mudança.
A segunda resposta mais comum é a nossa dificuldade em entender as mudanças dos outros. Em geral, conhecemos as razões de nossas mudanças — todas elas nos são perfeitamente justificáveis. O mesmo não acontece com mudanças dos outros, simplesmente porque não estamos na pele e na cabeça deles para saber. Podemos, no máximo, entender ou imaginar. Saber, só quem muda sabe. E, muitas vezes, nem isso.
A terceira resposta (e acredito que é a correta aqui, embora não descarte totalmente as outras duas) é a de que essa mudança se baseia no nível mais primitivo da moral (ou seja, aquilo que é bom para mim como indivíduo e não para a sociedade como um todo) e na ausência total ou parcial de ética. O problema dessa foto é que, até onde podemos inferir, ela não representa apenas uma mudança de postura ou de aliança, mas uma mudança de valores.
Victor Hugo disse que “a opinião de um homem pode mudar honrosamente, desde que a sua consciência não mude”. Talvez essa não seja uma verdade absoluta, mas é inevitável que certas mudanças políticas sejam, no mínimo, perturbadoras. A mudança de opinião da parte de um líder político não é tão simples quanto ele gostaria de fazer parecer, porque ela não é a posição de um indivíduo, mas de toda a coletividade que lhe dá sustentação. Escolhemos nossos líderes políticos porque vemos neles a representação de nossos valores morais e éticos, mesmo motivo pelo qual rejeitamos líderes políticos que representam valores antagônicos aos nossos. É muito natural, portanto, que muita gente sinta-se traída quando vê uma foto como essa.
Uma última pergunta inevitável: Quem traiu quem e desde quando? Para essa, ainda não tenho uma resposta, mas tenho muito medo do que vai acontecer até eu encontrá-la.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

QUADRINHEIROS ASSEMBLE!!!


É estranho pra caramba, mas é isso mesmo. O cara que mal tem tempo pra cuidar do próprio blog agora faz parte de um blog coletivo. O tema é relativamente específico: nerdices quadrinhísticas. Felizmente, somos um time de cinco blogueiros. Então, teoricamente existe uma chance menor do blog morrer. (Muito diferente do meu, portanto).
A proposta original dos Quadrinheiros era discutir os quadrinhos com um olhar mais acadêmico, já que todos somos, em maior ou menor grau, estudiosos dos quadrinhos. Na prática, é o que vamos fazer, mas não da maneira séria que imaginávamos. Meu papel lá, aliás, não é nada sério, o que é normal. Pouca coisa eu realmente levo a sério na vida.
É isso. Espero que vocês se divirtam por lá. De tempos em tempos, vou voltar aqui, porque é meu espaço para falar de qualquer coisa, mas vai ser mais fácil me encontrar lá.

terça-feira, 8 de maio de 2012

OSSOS DO OFÍCIO IX: O CHAMADO DO DEVER

© Images.com/Corbis

Ultimamente só escrevo aqui para reclamar. Aliás, estava escutando por esses dias uma entrevista de um sociólogo que falou, entre outras coisas, da tirania das redes sociais: o quão deprimente é ver que todas as pessoas estão bem, felizes, radiantes, porque quase ninguém compartilha mágoas, tristezas, o peso da vida. Bom… Isso me torna um “quase ninguém”. *risos*
Antes que eu comece a receber telefonemas (suponho que ainda haja quem goste disso), SMS, comentários, e-mails, scraps ou mensagens via Twitter ou Facebook, deixo claro que estou bem. Não estou em depressão (pelo menos não tenho apresentado os sinais característicos ‒ depois da crise que durou alguns anos, sei muito bem como identificar o problema), os ataques de ansiedade também não me perturbam há alguns meses e as únicas coisas que me incomodam fisicamente no momento são as dores na cabeça e nas costas (aprendi a viver com elas) e o fato de não poder tomar Coca-Cola por causa da glicemia (ISSO é realmente triste). Mas é fato que sinto-me ainda um tanto incomodado, perdido.
O trabalho este ano está bem mais fácil, uma vez que não preciso mais acordar às 5h da manhã todos os dias (exceto quarta-feira, que, por esse motivo e pelas 3h de reunião pedagógica, é meu novo dia mais odiado da semana). Isso serviu para me dar um ânimo novo nos primeiros meses, mas o efeito começa a passar. O problema é que estou, de novo, brigando comigo mesmo. A cabeça sabe que preciso fazer esse trabalho, que é minha responsabilidade fazer o maior número possível de alunos enxergar o mundo como algo que precisa mudar, que se eu deixar a sala-de-aula estarei dando as costas para uma missão que poucas pessoas estão dispostas e preparadas para cumprir. Mas o coração não está mais nisso. Ele não sabe o que quer, mas tem certeza de que não quer mais isso. E aqui estou eu, dividido entre o chamado do dever e a vontade de fazer outra coisa que ainda não sei o que é direito.
Nesse ponto, sou um daqueles casos de adolescência prolongada. Se a cabeça e o coração não entram em acordo, não encontro o senso de propósito de que tanto falo aos meus alunos. E sem um propósito, sem convicção, simplesmente saber que tenho uma missão a cumprir não é suficiente. Só me faz sentir culpa por não fazer aquilo que sei que deve ser feito. E tudo o mais, tudo MESMO, desanda enquanto eu não conseguir resolver isso.
Grande parte do problema é a enorme distância entre aquilo que tenho certeza de que devo fazer com meu trabalho e aquilo que todo o mundo (professores, meus superiores, alunos, pais de alunos, os burocratas do Estado, a mídia, a sociedade em geral) acha que devo fazer. Sem medo de parecer arrogante (porque sei que sou mesmo e nunca me importei em disfarçar), eu sei que estou certo e o mundo errado. Mas o mundo tem certeza de que estou errado e está disposto a fazer de tudo para me impedir de fazer aquilo que deve ser feito, inclusive me obrigar a gastar toneladas de papel com trabalho estupidocrático e trabalhar com gente que simplesmente não quer pensar porque acha difícil demais.
Saudades de quando eu ainda tinha o coração aberto para meus alunos (mesmo que nem sempre mostrasse isso). São só 13 anos de carreira, mas sinto como se tivesse perdido o coração pelo caminho há séculos. E nem faz tanto tempo assim que tive alunos que eu realmente posso dizer que amei.
Encerro com as palavras de um filósofo e poeta português. Minha cabeça sabe que o que ele diz é verdade, mas meu coração não acredita mais. E eu sei que a cabeça está certa. Agora preciso convencer o coração. Essa é sempre a parte mais difícil.

“Ser mestre não é de modo algum um emprego e a sua atividade se não pode aferir pelos métodos correntes; ganhar a vida é no professor um acréscimo e não o alvo; e o que importa, no seu juízo final, não é a idéia que fazem dele os homens do tempo; o que verdadeiramente há de pesar na balança é a pedra que lançou para os alicerces do futuro.”
Agostinho da Silva (1906-1996)

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

OSSOS DO OFÍCIO IX: CEGO GUIANDO CEGOS

© Images.com/Corbis

Fim das férias. Ainda estou cansado e parece que vou continuar assim por um tempo. Mas essa é a minha vida e grande parte da responsabilidade por ela ser assim é minha mesmo. Então, não adianta ficar reclamando.
Começou hoje o processo de atribuição de aulas na rede estadual paulista. E o processo ainda vai emperrar algumas vezes, pelo visto. De qualquer modo, uma coisa é positiva: voltarei a trabalhar à noite. Ainda está longe do ideal por duas razões: (1) vou trabalhar em 3 turnos e (2) minha cabeça funciona bem à noite, mas os alunos geralmente não. Se as coisas continuarem como estão, amanhã ainda posso aumentar a quantidade de aulas por semana para não ter um impacto negativo sobre meu salário.
Digo “se as coisas continuarem como estão” porque existe uma batalha judicial entre Estado, União e sindicatos que é muito complicada explicar aqui (e realmente não tenho vontade, porque quero descansar um pouco a cabeça). O que posso dizer é que esse tipo de indecisão me deixa muito angustiado, ainda mais porque não cabe a mim resolver a questão, mas é a minha vida (e a de sei-lá-quantos professores e uma quantidade ainda maior de estudantes) que está em jogo. E olha que eu me viro bem com improvisos e incertezas. Imagino o grau de angústia de outras pessoas.
Quando me tornei titular de cargo na rede estadual, me disseram que eu não ia mais enfrentar a angústia de não saber se conseguiria ser designado para alguma escola, se teria aulas suficientes para conseguir pagar as contas, se seria mandado para algum lugar mais perto ou mais distante… De fato, boa parte disso é passado para mim, ms a verdade é que continuo seguindo por uma estrada que não sei ainda aonde vai dar, mas que até o momento não tem uma paisagem muito agradável no meio do caminho. E a questão que fica é: se nem eu sei no que vai dar esse caminho, como posso esperar ensinar alguém a tomar decisões?

Conheça, também, o primeiro Aleateorias.